foto de: Rui Guerra (the night i was going to die)
Mãe, mãezinha
Minha mãe...
Viste-me nascer.
Mãe.
Não me viste crescer.
Julgaste, mãe.
(Julgam todas as mães?)
Aqui estou.
Grito às paredes do quarto:
Mãe, mãezinha!
(A vizinha de baixo vozeia.
Vou calar-me.
Vou tentar chorar sem ruído.
Soluçar no edredão.
Morder o travesseiro.)
Ele não me quer mais, mãe.
E elas adoram o meu corpo.
Adoram-me, mãe.
Ele não me quer, mãe
E eu...
Não te posso dizer, mãe
Não te sei dizer...
Irias perceber?
Queria tanto, mãe.
Queria tanto...
Recolhi-me aqui.
Desfiz a cama.
Acho que dormi.
(O remédio era doce, mãe.
A boca sabe-me a morango.
A cabeça está envolta em bruma
Parece bruma, mãe. Parece...)
Tu viste-me nascer, mãe.
E eu não sei mais crescer.
Perdoa, mãe.
Perdoa.
A foto deu o mote ao texto seleccionada por mim de entre um lote proposto num concurso promovido em Escritor Famoso e MRF .
5 comentários:
Poema doloroso. Transmites muito bem o que é ser homossexual e não o poder dizer às vezes nem à própria mãe. Portugal ainda é um país de muitos preconceitos. mas voltando ao poema, é teu e isso diz tudo: os sentimentos sempre a sobressairem. beijos
Fabuloso!
Neste "silêncio maior" encontramos a "mãe" que nos faltava no nosso imaginário. A mãe que não temos, a mãe que não vem. Este silêncio de mãe acorda o abraço, desperta novos horizontes, acaricia outra pele.
"Como vai crescer o amor, se Tu não estás?... Como vou eu entrar no meu caminho... se o caminho não tem flores mas espinhos?..."
O teu poema é diferente.
Fiquei surpreendido à medida que o ia lendo. Agradavelmente, claro. Porque gostei da abordagem que, como disse, é diferente da expectativa de quem lê.
Beijinhos e bfs
PS: Estranhei o pedido do poema. Estranho muito mais o teu silêncio. Afinal o que aconteceu?
Tema difícil (ainda, infelizmente) mas muito bem "agarrado" por ti. Terrível esse "silêncio maior"!
Beijão
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