o livro vai tomando o seu caminho
este nas mãos do filhote do Henry Bugalho brasileiro a viver em Manchester
um outro por Lisboa exposto na Ler Devagar
e a saga da 6ª Mostra teve uma segunda semana mais tranquila
mas no dia treze esteve lá a Cristina Taquelim contando
e que bem ela contava
e o livro lá foi na sua parafernália
e, no entretanto, o Francisco Castelo pretendeu receitas para cozinhar gaivotas, e eu escrevi uma quase ode aos pássaros que, destituídos das iguarias que lhes davam os barcos na faina de ir vir no encalço da sardinha, poluem os telhados e as ruas num desespero de raça ameaçada.
Reza assim:
Não a tomes demasiado nova
a melhor será a de Setembro
tem certeza se é nascida nesse ano
se tem ainda algumas penas de castanho
se o grasnar é, ainda, pouco altivo e pouco atrevido
Ficarás observando pelas noites de finais de Agosto
verás as mães vigias em seus poisos
e saberás que, esses, são animais velhos
tios e pais dos que apenas de dia andam voando
Aguardarás pelos dias de Setembro
quase Outubro chegando
e tomarás um sabre
terás que munir-te da faca dos antepassados
um sabre de gume afiado
uma lâmina num redondo que iguale a lua em crescente
com ela virada ao luar de uma lua a imitar luar de Agosto
encandearás o bicho
tomarás seu distraimento em tuas mãos e
de um só golpe
com um rodar firme, lhe cortarás o pescoço
e deixarás que sangre
deixarás que pingue o sangue sobre o sumo de limões apanhados por uma lua azul
apenas limões desses farão reverter o coalho
e enquanto aguardas que o corpo da ave fique seco dos humores da vida
que oiças por outras tantas noites o grito desespero
o grasnar estridente de seus ancestrais
o bater de asas
os voos rasantes que te farão e de que deves escudar-te
os bandos ruidosos a tornarem branco o céu da noite
Só depois farás o que é costume
Escaldarás em água o que foi ser livre
e deitarás em cova de areia
uma cova funda na areia da praia
as penas que tiraste do seu corpo morto
uma a uma
farás desse modo ou terás em teu porvir
em cada dia e noite
em todo o sítio onde te encontrares
o grito imenso da gaivota que mataste
e ainda que te cuides em cada um deste gestos que aqui aconselho
coisas que me dizem os deuses e meus avós deixaram de uns aos outros
ainda assim,
que seja cabidela ou canja
ou que faças sua carne como se fosse arroz de pato
terás em cada noite de qualquer Agosto
o ruido cavo que são as suas patas poisando
antes de teres desferido o golpe.
2 comentários:
Não consigo ver a página 11.
O poema aqui arrepiou-me toda:)
Beijos
Matar gaivotas para comer? Nunca ouvi falar de tal coisa. Diz-se, aliás, que as gaivotas sabem a peixe, mas quem o diz nunca provou nem sabe de quem o tenha feito
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