quarta-feira, 27 de setembro de 2006

muros

Sabe-me bem pisar a rua fresca de suores da noite, mal dormidos de espermas desfeitos em camas solitárias.
Gosto de espreitar o sol a desadormecer além de montes, planícies, areias ou mar, telhados de cidade ou um rio ou uma seara em Agosto.
O que eu gosto de me acordar com as ruas de uma cidade!
As vozes dos vendedores que já se ouvem desde muito antes de eu por ali andar. O mercado que abriu as portas e as caixas de fruta e peixe saltitando de mão em mão brilhantes e coloridas. No quiosque, os jornais cheiram ou já nem cheiram os jornais e eu os sinto tal no ar fresco da manhã. Num café, abrem-se devagar as portadas e oiço o ruído da máquina a triturar o grão. Um cão faz a sua mija matinal na árvore ainda recostada numa sombra alongada e eu imagino-me entre os muros de uma cidadela fedendo de poucas águas e lavares. Duas mulheres, atravessam a rua. Conversam. Oiço-as apenas. Passaram por mim uns segundos e deixaram um rasto. Peças de puzzel, esta vida!
Uma persiana sobe no que me soa a bons dias. A janela abre. Um busto de mulher jovem espreita o quintal em baixo. Fecha a janela. Fico a olhar. Abre-se a janela noutra extremidade. A mulher curva-se ligeira, espreitadora, na direcção do quintal em baixo. Pensa decerto nas pessoas que lá se encontram. Uma delas, um homem, olha para cima e a janela fecha-se num repente.
E eu a olhar. E eu a conjecturar.
É manhã. O dia novo instalou-se.
Já saboreei o meu deambular na rua fresca do suor da noite.
Não quero entrar nas casas de ninguém. Não quero perceber aquela mulher. Não quero perceber que a posso entender. Vou devagar conduzindo os meus passos e deixar que as ruas da cidade se indiferentem de mim e eu delas ao sol deste Agosto escaldante.

imagem daqui

6 comentários:

Alberto Oliveira disse...

... bem que gostava de ter acordado ao som do levantar dessa cidade de que falas. Mas o Agosto já se foi. Fica para o ano. Hoje estou a espreitar o Outono que ainda é uma criança nos primeiros passos.

wind disse...

Escritora, já esgotei as palavras para te comentar.
Agora só o banal:Excelente!
beijos

Anónimo disse...

A mim só me apetece dizer: "Bom dia !"
A culpa deve ser tua... :-)

Beijo

A. Pinto Correia disse...

Já te disse que tens uma escrita fabulosa?

Nia disse...

Há muito que não sentia este fresco sentir no escrever.Estás como o dia ao amanhecer:cheia de coisas tuas enroladas de ar fresco matinal,salpicadas de cheiro de café acabado de fazer...
Entro naquele Café da Esquina..mando vir uma torrada...e sento-me.

augustoM disse...

Mas que madrugadora, numa manhã de Agosto, só podia ser.
Um abraço. Augusto

adoro estes espectáculos - este é no mercado de Valência

desafio dos escritores

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meu honroso quarto lugar

ABRIL DE 2008

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meu Abril vai ficando velhinho precisa de carinho o meu Abril

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ai meu Abril, meu Abril...




dizia ele

"Só há duas coisas infinitas: o Universo e a estupidez humana. Mas quanto à primeira não tenho a certeza."
Einstein