Deitou-se no sofá frente à televisão. A cozinha arrumada. A luz do candeeiro, muito velada, deixava em quase escuridão o grande espaço da sala onde tremelicava a luz da televisão. Ouvia mais do que olhava. Um ruído estranho e constante fê-la prestar atenção. Soergueu-se devagar, atenta. Voltou a recostar-se. Era a máquina de lavar. Punha as máquinas a funcionar sem pensar no que estava a fazer e depois nem de tal se lembrava. Esta mania de estar sempre a pensar longe. O noticiário acabou. Desligou a televisão e colocou música. No livro que andava lendo, mal passou duas linhas. A cabeça a andar às voltas. Interrogava-se. Espantava-se. Ela ali a sentir que, nestes últimos tempos, ou andava acompanhando mais as actualidades ou se andavam passando aconteceres tão estranhos que a levavam a dar-lhes atenção. Ou seriam as duas coisas?! Sorriu. Deixou que as imagens se formassem usando os olhos de ver para dentro e para longe. Pensava assim perceber ou, ao menos, relaxar.
Uma lagoa de terra muito escura. Um castanho quase negro. Disse lagoa, mas era mais uma enorme cratera de terra muito esfarelada em todo o perímetro e que se acumulava assim no centro. Uma brisa soprava e a terra do centro espraiava pelo espaço. Um espaço que parecia uma cúpula translúcida sem cor definida. Um horizonte que não acabava. Que não se percebia onde acabava. Era da neblina intensa ou daquela luminosidade esbranquiçada.
Concentrou-se um pouco mais naquela interioridade que a levava a outros lugares.
Como que foi abarcando para além daquele buraco árido. Era como se estivesse andando por lá... Uma casa enorme toda branca. Um casarão com portões, portas, muitas janelas. Tudo fechado.
Deve ter ficado ansiosa naquele exercício de olhar com os olhos de ver para dentro. Deve ter sido isso.
De repente estava na parte detrás da casa e havia um tanque e uma trepadeira sobre um tanque onde água fresca corria de uma telha. Uma rapariga, via-a detrás, devia estar aparando água. Dobrada sobre o tanque devia estar molhando o vestido vermelho. Devia ter um avental largo. Via o laço branco atado atrás.
Era o que ela via com os olhos de passear para lá do de dentro de si.
Sentiu que tinha sede. Sentiu que tinha medo de voltar à cratera. Sentiu que lhe era estranho haver ali água e flores e uma casa e antes aquela paisagem morta. Sentiu que era bom que houvesse ali gente. Sentiu que era estranho a moça não se voltar. Sentiu que estava com muito medo e não sabia de quê. Já etava quase tocando a moça e sentia um estranho tremor, um quase desejo.
De repente, percebeu porque era vermelho o vestido da moça e de igual cor estava mesclada a água do tanque...
Tentou ir mais longe naquele ver para lá do de dentro de si. Tentou voltar a usar os olhos de ver para dentro, mas não conseguiu.
Ergueu-se e foi estender a roupa. A máquina acabara a lavagem.
Sentiu tristeza e receio ao pensar que perdera os olhos de olhar para de dentro ou que estes viam o mesmo que os outros...
Uma lagoa de terra muito escura. Um castanho quase negro. Disse lagoa, mas era mais uma enorme cratera de terra muito esfarelada em todo o perímetro e que se acumulava assim no centro. Uma brisa soprava e a terra do centro espraiava pelo espaço. Um espaço que parecia uma cúpula translúcida sem cor definida. Um horizonte que não acabava. Que não se percebia onde acabava. Era da neblina intensa ou daquela luminosidade esbranquiçada.
Concentrou-se um pouco mais naquela interioridade que a levava a outros lugares.
Como que foi abarcando para além daquele buraco árido. Era como se estivesse andando por lá... Uma casa enorme toda branca. Um casarão com portões, portas, muitas janelas. Tudo fechado.
Deve ter ficado ansiosa naquele exercício de olhar com os olhos de ver para dentro. Deve ter sido isso.
De repente estava na parte detrás da casa e havia um tanque e uma trepadeira sobre um tanque onde água fresca corria de uma telha. Uma rapariga, via-a detrás, devia estar aparando água. Dobrada sobre o tanque devia estar molhando o vestido vermelho. Devia ter um avental largo. Via o laço branco atado atrás.
Era o que ela via com os olhos de passear para lá do de dentro de si.
Sentiu que tinha sede. Sentiu que tinha medo de voltar à cratera. Sentiu que lhe era estranho haver ali água e flores e uma casa e antes aquela paisagem morta. Sentiu que era bom que houvesse ali gente. Sentiu que era estranho a moça não se voltar. Sentiu que estava com muito medo e não sabia de quê. Já etava quase tocando a moça e sentia um estranho tremor, um quase desejo.
De repente, percebeu porque era vermelho o vestido da moça e de igual cor estava mesclada a água do tanque...
Tentou ir mais longe naquele ver para lá do de dentro de si. Tentou voltar a usar os olhos de ver para dentro, mas não conseguiu.
Ergueu-se e foi estender a roupa. A máquina acabara a lavagem.
Sentiu tristeza e receio ao pensar que perdera os olhos de olhar para de dentro ou que estes viam o mesmo que os outros...
13 comentários:
É bom viajar no pensamento... ele leva-nos onde nunca sonhamos ir!
Olá vó! Vim para deixar um beijinho e desejar um bom resto de seman. Da neta blogueira, Ana
Extraordinário conto que nos leva também nas asas do pensamento:) beijos
Seila vc escreve muito bem!! adorei o post =))
feliz do amigo viu, 20 de julho.
beijos,
Rah
Seila,
Levaste-me a viajar por espaços infinitos...
Quero agradecer as palavras amáveis que deixaste.
São sempre agradáveis de ler...
Até sempre.
Venho apresentar as minhas poesias, gostei deste blog, mas regresso com mais tempo, zezinho
estou certa de k esses olhos nunca se fecharão, antes pelo contrário..Bj grande e bom f.s
Gostei de viajar com os teus olhos de olhar para dentro. É um belo texto.
Eu sou mais especialista em sapatos mas, qualquer dia, vou tentar ver para dentro também.
Beijinhos
perde-se por vezes a capacidade de sonhar ou de olhar com esses olhos "para olhar para de dentro" como tão bem dizes. execepcional. abraço
Pedido de Ajuda no meu Blog! Trata-se do "Chuviscos"... Por favor vão lá ver!
Mais uma boa história. tens recebido os meus mails? hoje enviei-te o maldito!!!!
Beijinho grande.
"...Tentou voltar a usar os olhos de ver para dentro, mas não conseguiu..."
Uma viagem ao interior da nossa alma, onde por vezes nos perdemos...
Adorei toda a sensibilidade do teu texto.
Um abraço e bom fim de semana :)
A este, tive que o ler por duas vezes. Ainda assim, não chegou. Tens tantas referências apensas, que é viajar por dentro da viagem das tuas próprias palavras!
"ou que estes viam o mesmo que os outros..." - destaca-se do moto "olhos de olhar para de dentro", e justificam em parte o título.
Rapariga, explica-me lá por que raios te tenho andado a perder? A tua escrita aprimorou-se e flui, num jeito que é já teu. Tem o teu cunho, Seilá. E é boooommmm
Enviar um comentário