Trazia no pescoço um lenço num
tecido vistoso. E do lado esquerdo, que é o lado do coração, um lencinho
vermelho assim como sangue a ensopar-lhe o branco do casaco.
Nem seria por ele estar
chegando que soavam foguetes.
Florentino chegava no barco
e vinha por trabalho.
Vestidinho de branco, não
fosse o lenço no pescoço e mais o encarnado do lencinho no bolso do casaco, e o
sapato que era em verniz negro como o seu cabelo, uma carapinha farta besuntada
a brilhantina por baixo do chapéu de palhinha com fita igualzinha à cor do fato
que vestia, e era branco.
Foi como o viu Maria Rosa, e
ela mesma conta:
– Era um mulato escuro e
vinha tão bonito no seu fato imaculado!
Era o dia da Festa e daí os
foguetes. Era também o dia de chegar o barco.
Não o sabia Florentino, como
não sabia que Rosinha o olhava lá de longe. Florentino encandeado do sol que
brilhava na janelinha onde ela assomava numa das casinhas da aldeia. Calçada do Cipreste era onde ficava a casa de Maria
Rosa.
Brilhava um sol de início de
Verão que também cintilava no campanário da Igreja, e na areia da praia e nas
ameias do Forte.
E Florentino que já vira
muito, ainda assim, embasbacava.
Ele a dar duas dobras nas
calças, e a mostrar a peúga muito alva.
O marinheiro tinha avisado:
– Arregacem a roupa –
estavam eles a entrar no bote e eram, além de Florentino, um homem que trazia
galinhas num cabaz, e uma mulher anafada que tinha jeito de ser quem deitaria
cartas e faria nascer os meninos lá na aldeia.
Lá ao longe, fora do olhar
de Florentino, era Maria Rosa a esconder-se na sombra de um rendado de cortina,
que nem que ele a não visse devia recatar-se. E dizia.de si para consigo:
– Que lindo homem está
chegando.
Rosinha numa janela da
casinha que ficava para lá da tira de areia, no único cabeço da aldeia
aconchegada nas muralhas do Forte. Não a sabia Florentino a chegar no bote, tinha
ficado o barco grande atracado, ao largo. E mal jogou um pé fora do barquito,
veio uma ondinha de um levante que se amodorrara e lambeu-lhe o linho alvo do
tecido de que era feito o fato. Na janela, Maria Rosa riu-se de maldade. E riu
ainda mais quando a areia recebeu o sapato de Florentino como se o devorasse.
Florentino a entrar ensopado
na Aldeia da Senhora do Forte, e era afinal como entrava todo o mundo que chegava
pelo mar, antes de estar acabado o cais. Trazia na mão uma maleta em cabedal
curtido que era onde vinha o material de que faria uso, ali, como já fizera em
outros lados.
O mulato todo vestido de
branco, não fosse o salpico colorido que trazia nos lenços e nos sapatos, havia
de dar a conhecer os seus serviços a um e outro.
Soube desde logo que havia
de fazer bom negócio a olhar os homens barbudos e bem servidos de cabelo que
cirandavam pelo areal.
Florentino, barbeiro vindo
de terras quentes mais a sul, não sabia que, à sua chegada, estava, a
namorar-lhe outros dotes, a menina mais bonita da aldeia.
E nem ele nem ela adivinhavam
que o casório deles se faria noutro mês de começar o Verão, quando fosse
inaugurado o cais e aí baptizado Cais das Dunas.
Quando fosse outra Festa em honra da Senhora do Forte.
Lido
na Festa do 20º aniversário da Aldeia da Nossa Senhora do Forte - 22 de Junho de 2013
1 comentário:
Adorável descrição e que ternura de conto:)
Beijos
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