Feia. Ela é muito feia.
Não que tenha um nariz vermelho e uma verruga assente por ali no queixo com dois ou três cabelos a sair-lhe espetados e duros.
Não.
Também a pele, apesar da idade, se mostra ainda macia e até corada, e no pescoço não descai.
Tem, é certo, o cabelo ralo e vê-se-lhe o couro cabeludo por mais arrumado que lhe esteja o penteado levemente descaído para o lado. Mas pelo cabelo não lhe vem a fealdade se bem que seja este um cabelo pintado, fraco, que não suporta, nem com o melhor cabeleireiro, um belo penteado.
Não.
Ela é feia de outra fealdade se bem que nada deva à beleza nem agora que os anos lhe passaram, nem, nota-se, na mocidade.
Tem uma boca fina que repuxa de lado nos sorrisos que faz. Raros.
Se rirá, eu não sei, mas tenho para mim, é o que me parece: ela não ri, assim um rir de estar contente e fazer os outros gargalhar. A boca fechada não mostra sentimento mais que um cinismo latente, uma vontade, que se lhe adivinha também nos olhos pardos, mas que não é vontade de viver e acalentar sonhos, mas a vontade daqueles que, chegados a um poder por pequeno, se atentam de minar a paz dos outros e sonham acordados o modo de o fazer e nem dormem sonhos descansados.
Entendem porque digo que ela não é feia daquele feio de ter nascido por aí ao abandono e ter-lhe calhado em sina uma cara longa, de pele rugosa e um nariz quadrado cheio de pontos negros e, ainda mais, um lábio de cima dependurado, como uma pele vermelha sobre o debaixo.
Ela tem um ar decente. Apercebe-se que pode até ter sido uma moça a quem pedissem para sair a uma matiné, conversassem de interesses de pinturas ou outras culturas. Não vem ao caso isso.
Ela é feia e isso não tem que ver com a pele, a forma do nariz, o torneado da boca ou a cor do cabelo e a sua textura.
Tem que ver com outra coisa que eu não sei dizer mas que lhe noto e mal a vejo digo em pensamento:
“Que feia criatura! Raio que a mulher não deve à beleza nem um disto” e uno o meu polegar da mão direita à falangeta do dedo mínimo da mesma mão.
E ela é mesmo horrível.
Para mim, evidentemente!
sexta-feira, 27 de julho de 2007
desabafo profundo
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adoro estes espectáculos - este é no mercado de Valência
ABRIL DE 2008
Abril de 2009
dizia ele
"Só há duas coisas infinitas: o Universo e a estupidez humana. Mas quanto à primeira não tenho a certeza."
Einstein
Einstein
5 comentários:
Realmente feia, essa mulher. E o pior é não há remédio que tire as verrugas da alma ...
ensinaram-te a fazer fisgas assim? eu sei que me ensinaram a fazer fisgas (parece que me quebrantaram um dia, não sei bem, começava sempre a rir que nem uma perdida quando tentavam contar-me) mas já não me lembro como era :)
Pois....adorei o texto.
Jinhos
É na nossa interioridade que se encontra a principal responsável para que sejamos feios ou bonitos aos olhos dos outros. Salvo casos muitos especiais de fealdade fisica a beleza da alma e, sobretudo a harmonia que transmitimos, é que nos conferem a verdadeira beleza.
Escritora, excelente descrição!
Beijos
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